Os irmãos Geadas – Óscar e António Luis – são filhos dos proprietários dum dos restaurantes de referência em Trás-os-Montes, o “Geadas”, em Bragança. E seguiram as pisadas dos pais, com distinção, o Óscar na cozinha e o António Luis na sala. Há uns anos atrás tomaram conta da Pousada de S. Bartolomeu, ainda em Bragança. Ali desenvolveram um trabalho aturado, que culminou com a obtenção duma estrela do guia Michelin para o restaurante G, até agora a única em todo o Trás-os-Montes.
Mas como não gostam de estar parados, resolveram abrir uma pequena casa de petiscos na zona histórica da cidade a que chamaram “Contradição”. É um espaço muito pequeno, numa ruela estreita, mas que conta com uma esplanada, a ampliar a capacidade de receber mais clientes. É uma sala sobre o quadrado que tem ao fundo um balcão por detrás do qual está a minúscula cozinha. A parede da direita tem enorme espelho que dá amplitude á sala, por cima do qual muitos pratos de loiça portuguesa. Na parede da esquerda um balcão de apoio e algumas bebidas espirituosas.
Por ali vai circulando parte do pessoal do restaurante da pousada, que dá corpo á criatividade do chefe Óscar, de que resultam petiscos e pratos muito interessantes e até desafiantes. O António Luis vai-se divertindo a escolher os vinhos adequados, na esmagadora maioria transmontanos, numa aposta que se saúda. Alguns desses vinhos são quase desconhecidos, de pequenos produtores, por vezes desconcertantes, tal a originalidade e qualidade.
Para a mesa vem um pano de burel a envolver fatias de focaccia, pão de trigo tradicional e centeio. Depois, bem quentes, a chamussa e o pastel de massa tenra com carne de javali e cordeiro, deliciosos.
Em Trás-os-Montes não pode faltar a alheira. Aqui aparece numa versão de migas de alheira, maçã, croutons e ovo – o crocante dos croutons a contrastar com a maçã aveludada e a qualidade da alheira, ácida, deliciosa, tudo envolvido pelo ovo. Uma festa de paladares.
Seguiu-se a massada de grão com enchidos e bacalhau confitado, com uma borboleta de tinta de choco. Lembra um rancho, com massa de meada, numa ligação do taco de bacalhau com carnes de porco que era tradição em algumas regiões e que se foi perdendo. Um conjunto delicioso. Estiveram também num nível altíssimo as bochechas de vaca estufadas, puré de batata com alho negro e pequenos legumes. Suavidade, paladar e textura delicada. Ainda tivemos coragem de ir ao porco bísaro grelhado, puré de couve flor e avelã, salada de agriões. Carne de porco soberba, muito bem acompanhada com o contraste entre avelã e couve flor, com a acidez dos agriões a fazer a ligação. Excelente.
Terminou-se com cup-cake de chocolate e doce de castanha. Brilhante! Outra coisa que se saúda é a utilização de louça bastante variada, mas toda portuguesa, de várias regiões, de extremo bom gosto.
Provaram-se vinhos deliciosos, a confirmar que a região transmontana é uma das regiões vínicas a ter muito em conta. Head Rock Tinto Reserva 2015 poderoso nos seus 13,5% de álcool, Maria Gins Tinto 2018, preparado só com Tinta Amarela, mas com 14% de alcool, um vinho excitante, delicioso, Saroto Tinto apenas com 11,5% de álcool, quase provocador, até um Menina d´Uva da região de Vimioso, um palhete muito interessante.
Com a sobremesa foi servido o licoroso da Quinta de Sobreiró de Cima, mais uma boa surpresa transmontana.
Ali está-se muito bem, com comida de excelência e vinhos transmontanos fantásticos, sem qualquer contradição…
Um passeio pela zona histórica de Bragança é quase obrigatório.