Jaime Cruz é um entusiasta da gastronomia e dos vinhos e há muitos anos, duma maneira ou de outra, ligado a estas áreas complementares. É escanção de formação e esteve também muitos anos ligado a uma empresa de distribuição de vinhos no Funchal. Fez muitas cartas de vinho, sempre com a preocupação de escolher soluções que ligassem bem com as comidas, fez provas comentadas, workshops e tantas outras coisas ligadas ao vinho e veio a montar a sua própria distribuidora de vinhos. Mas o Jaime também tem o dom da cozinha, que herdou da mãe e de que gosta muito. De tal maneira que, depois de passar por vários restaurantes como sócio e a cozinhar, e depois de vender a distribuidora, arrancou com o seu próprio espaço há cerca de 4 anos, numa das ruelas da zona histórica do Funchal, a que deu o sugestivo nome de “Lá Ao Fundo”. Onde dá largas ao seu bom gosto e sabedoria. É uma sala espaçosa, bem decorada em tons cinza e castanho, com pequeno balcão de serventia. Nas várias prateleiras pululam muitos vinhos de todo o país, uma das paixões do Jaime. Mas o espaço mais procurado é a enorme esplanada, literalmente coberta por enormes guarda-sóis.
Faça sol ou chuva, está-se bem ali, até porque a temperatura ambiente no Funchal é fantástica, de dia ou de noite e praticamente durante todo o ano. As mesas são muito bem postas, com bons atoalhados e guardanapos e serviço garantido por pessoal competente, simpático e atento. O couvert traz azeitonas pretas, azeite balsâmico e paté de atum muito saboroso. A ementa é bastante eclética, viajando por vários tipos de cozinha, com uma forte componente de carnes grelhadas, com a utilização, já na mesa, de pedras bem quentes para colocarmos a carne e acabar de a cozinhar no ponto desejado. A picanha e o bife na pedra são os mais procurados. Mas voltemos ao início, ás entradas, que são deliciosas. Sobretudo as chamussas, que são feitas na casa e são incríveis: a mais sofisticada com queijo Brie e pêra bêbada, e as outras duas, a vegetariana e a de frango com molho massala. O arroz malandro de cherne e gambas é um caldoso extraordinário, de consistência e paladares, com peixe fresquíssimo e tempero perfeito. E o Jaime até pode, numa mesa preparada para o efeito, preparar ali mesmo no meio da esplanada, ao vivo, um dos melhores bifes tártaros que conheço, com todos os matadores.
As influências das cozinhas moçambicana e goesa, vindas dos pais, manifestam-se em algumas das opções que o Jaime nos coloca na mesa, entre caris, pulaos e chacutis, e até mesmo algumas sopas, em que especiarias várias e picante de óptima qualidade andam de mãos dadas. A sopa gratinada de tomate e cebola é fantástica. Mas a opção pode muito bem ser uma porção de atum fresco daquele mar, trabalhado na grelha a preceito, muito mal passado, um pouco de sal e pouco mais, na companhia de beterraba desidratada e dum risotto de lima, num casamento feliz. Depois é um desfilar de pratos deliciosos: bóbó de camarão à Capixaba, filete de espada com migas de milho gratinadas, polvo na frigideira com pimentos Padrón e esmagada de grão de bico, risotto de açafrão e gengibre com filetes de dourada, uns soberbos camarões com coentros e arroz selvagem ou o caril de camarão á Moçambique. Para além das carnes grelhadas na pedra, aparece o caril de galinha á moçambicana, o pernil de borrego á moda antiga, o carrett de borrego com puré de castanhas, chutney de laranja e gengibre, a chiken tikka massala bem temperada ou o naco de filete “Lá Ao Fundo”.
Para os que tenham menos apetite ou que apenas queiram petiscar, há várias saladas e pastas preparadas ao momento e alguns petiscos: bruschetas, tábuas de queijos, tostas, preguitos, prego especial em bolo de caco e picadinho á nossa moda. Nas sobremesas o Jaime faz viagens deliciosas e muito gulosas, por esse mundo fora, para mal dos nossos pecados! E propõe-nos sempre vinhos que vão ligar muito bem com os vários tipos de comida. A refeição acaba invariavelmente com um copo de vinho Madeira, servido á temperatura correcta, a lembrar-nos a qualidade e exclusividade deste vinho único no mundo, e que o Jaime nunca se cansa de divulgar. Que bem se está ali ao fundo…